*Por Alexandre Annibale
A qualidade do sono está diretamente ligada à saúde física, mental e emocional. Dormir bem é essencial para a regulação hormonal, a consolidação da memória, a recuperação muscular e o equilíbrio do sistema cardiovascular. Por outro lado, noites mal dormidas afetam o humor, a produtividade e aumentam o risco de doenças crônicas. Em meio a tantos fatores que influenciam o sono, um aspecto muitas vezes negligenciado ganha destaque: o papel do cirurgião-dentista na prevenção, diagnóstico e tratamento de distúrbios respiratórios do sono.
A odontologia do sono é uma especialidade cada vez mais relevante na prática clínica moderna. Ela se dedica ao estudo e manejo de condições como a apneia obstrutiva do sono (AOS), o ronco primário e o bruxismo — distúrbios que têm origem ou impacto direto na estrutura das vias aéreas superiores, incluindo mandíbula, língua, palato mole e musculatura orofaríngea.
A AOS, por exemplo, é caracterizada pela obstrução parcial ou total das vias aéreas durante o sono, provocando interrupções momentâneas na respiração, que resultam em microdespertares ao longo da noite. Em muitos casos, esses episódios não são percebidos pelo próprio paciente, mas comprometem significativamente a qualidade do sono, levando à sonolência diurna, perda de memória, dores de cabeça e até alterações metabólicas e cardiovasculares graves.
É nesse cenário que o dentista entra como um agente de saúde multidisciplinar. Por meio de uma avaliação criteriosa — que envolve exame clínico da cavidade oral, histórico do paciente e, quando necessário, encaminhamento para exames como a polissonografia —, o profissional pode identificar sinais sugestivos de AOS ou outros distúrbios do sono. Alterações como retração mandibular, hipertrofia de tecidos moles, desgaste dentário anormal e queixas de bruxismo são indicativos que não devem ser ignorados.
Quando confirmado o diagnóstico (em parceria com médicos do sono), o dentista capacitado pode indicar o uso de dispositivos intraorais, especialmente eficazes em casos leves a moderados de apneia. Esses aparelhos, personalizados para cada paciente, promovem o avanço mandibular, criando espaço na via aérea superior e reduzindo ou eliminando os episódios de colapso respiratório noturno.
Mas o papel do dentista vai além da prescrição do dispositivo. Ele também orienta o paciente sobre a higiene do sono — conjunto de práticas que favorecem um sono mais reparador —, acompanha a adaptação ao tratamento, monitora o progresso com exames periódicos e pode ainda atuar na prevenção, identificando precocemente alterações faciais em crianças e adolescentes que indicam risco de distúrbios respiratórios futuros.
Vale destacar que a abordagem ideal para tratar distúrbios do sono é sempre multidisciplinar. O trabalho conjunto entre dentistas, otorrinolaringologistas, pneumologistas, neurologistas, fisioterapeutas respiratórios e fonoaudiólogos amplia a eficácia do tratamento e promove uma visão integral do paciente.
*Alexandre Annibale é cirurgião dentista, especialista em ortodontia, capacitado em odontologia do sono e doutorando pelo laboratório do sono do InCor, da Faculdade de Medicina da USP.
Av. Rebouças, 411 (Jardim Paulista), São Paulo, SP